segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

A caixa de vidro


No alto daquele apartamento pensei em você.

Pensei em me jogar.

Me perder em meio ao vento,

com o ar batendo em meu rosto.

Me misturar em meio ao som das nuvens

Você.

Voar.

Estou na rua.

Abro uma garrafa de vinho barato.

Sinto saudades, uma dor no peito.

É outono.

Não vi aquela tarde cinza passar.

O vinho me tem um gosto amargo.

Não ligo.

Continuo a andar.

Acendo um cigarro.

Ao primeiro trago a fumaça me invade o corpo.

Alívio.

Estou em uma cidade desconhecida,

completamente só,

cercado por meus pensamentos,

as minhas lembranças, a minha saudade.

A muito tempo eu perdi a minha infância.

Infância.

Tempo de não se pensar em nada,

tempo em que os dias eram compridos e um pouco mais coloridos.

As crianças são sinceras.


As pessoas precisam ser sinceras.

Precisam voltar a ser crianças.

O gosto do vinho é amargo.

Minha vista começa a embaçar.

Milhões de pensamentos me vem a mente.


...



Lá fora, do outro lado dessa parede envidraçada,

o vento sopra forte.

São 19:38.

Há uma garota no banco ao lado dormindo.

Eu só queria estar lá fora nesse momento,

e poder andar livre.


Eu queria poder voar.

domingo, 28 de dezembro de 2008

Como um filme do Gus

A vida se esvai, como em um cinzeiro sujo.
A ponta caí, mais com a brasa ainda acessa.
Ela queima, mesmo estando já quase apagada.
O cheiro fica, a vida se vai.
Ele já cheio, cinzeiro apagando, os que nascem e os que se vão.
E só mais uma garrafa, é só mais um porre.
Há os que ficam, já se passam das 3:00.
E muitos ainda dormem, pra acordarem um dia.
O sol queimando as vistas, a pele se desprendendo do corpo.
Os passos rápidos, preocupados com o tempo do mundo.
Debaixo do braço, um velho contador de histórias.
O ônibus sempre cheio, as pessoa apressadas,
todos temos horários.
A cabeça gira, não, o trânsito não mais importa.
As frases, as vidas ao redor,
tudo soa como um filme em andamento lento,
tipo filme do Gus.
As armas, as guerras, tudo tão longe, longe daqui.
As repartições, escritórios, lugares mortos,
frente a dureza de se andar descalço por aí,
sem meias, sem destino.
Só tendo em frente os próprios passos.
Transpondo todos os mares do mundo,
correndo sempre pra alcançar uma vida que não mais se conhece.
Todos, todos se foram, seguiram a sua maré.

E, e...

Vamos, pegue as suas armas, mate por um ideal.
Mais que ideal... os ideais se foram,
NADA tem mais sentido... essa vida não passa de mais um comercial da coca-cola.
Todos sorrindo, todos vivendo tranquilos.
Não há nada de novo no fronte,
e nem em lugar nenhum.

pg. 118/119

"...Era um sábado a noite. Estávamos debaixo de um poste
pedindo carona, quando, repentinamente, carros repletos de garotos
rugiram com enfeites esvoaçantes:
"Haa! Haa! Ganhamos!." gritavam todos eles.
E então nos vaiaram e zumbiram zombando ao verem uma garota
e um cara na estrada.
Dúzias de carros assim passaram por ali,
cheios de rostos jovens e "jovens vozes arrogantes" como diz o ditado.
Eu odiava cada um deles.
Quem eles pensavam que eram, vaiando alguém na estrada só porque
eram jovens desordeiros e secundaristas e seus pais assavam rosbifes nas tardes de domingo?
Quem eles pensavam que eram,
zombando de uma menina numa situação difícil com um homem que queria ser amado?..."

Nostálgico

Quando nasce o sol,
divido entre o sentimento...
e o desejo.
Ela abre a porta,
"chega mais perto...".
O espaço vazio.
Há somente a mesa,
os livros na estante e a sua alma.
Ali deitada.
Os pensamentos vagueiam.
É só mais uma noite qualquer.
Ela caminha.
Lá está.
"Por favor, abra os seus olhos..."
Ele abre.
É só mais uma noite.
"Chega mais perto..."
Depois de anos andando,
vagando pelas velhas portas,
dando um pouco de si pra todos que queriam ouvir.
Os muros.
As estradas.
"Não, por favor, não me mate de novo..."
Ela deita.
Ao seu lado.
A alma morta.
O sonho livre, já solto,
percorrendo o ar.
As mãos lhe envolvem o pescoço.
O amor voltando,
correndo por suas veias.
O corpo cansado...
volta a brilhar...
junto com o sol que nasce.
É só mais uma noite...
Só mais uma noite...


Ele acorda.
O sonho se foi.
O mundo chama.
O velho trabalho.
O mesmo travesseiro.
O urso sobre a mesa.
O sonho.
E sua mesma vida.

Envolto pelo dia ele se vai.
Esperando pelo sono... quando ele vier.

3:53

O espaço espera.
Quieto.
Os sentimentos correm...desesperados.
A alma espera.
O espaço vazio.
A tela.
As letras.
A vida corre, a vida não espera.
Tudo ao redor, e eles sempre se vão.
A loucura deixando o corpo, e o copo.
Sempre ali.
Companheiro.
Talvez o único.